Fotografia de Bruno Simão |
Nesta criação colectiva de Carlos Paulo, João Tempera e Hugo Franco deparamo-nos com um cenário minimalista que pode ser pós-apocalíptico ou pré-civilizacional, mas que apenas nos mostra um bocado isolado do mundo.
Este cenário é constituído por objectos com uma função em cena, simbólica e estética, que nos dá o estado de espírito das personagens (nos baloiços), a medição de forças entre elas, o seu domínio psicológico (no balancé), a tentativa de contacto com o mundo exterior àquele círculo, mesmo que seja através da solidão (no buraco de onde inicialmente emergem as personagens, para onde fogem e onde está o pôr-do-sol). Inclusivamente uma das personagens está em cena apenas através do cenário, um altifalante.
O cenário dá força às interpretações e é parte fundamental da encenação, é funcional.
Fotografia de Bruno Simão |
Em Agonia Irreversível, a encenação serve a palavra.
A movimentação das personagens, a utilização dos objectos de cena, a postura dos actores e o ritmo imposto apenas são suporte da mensagem, das mensagens sobrepostas que nos querem transmitir.
O ritmo frenético da peça faz-nos ter o cérebro alerta, pensar, mas também traz o risco de embalar. De repente, o sentido do que é dito pode perder-se na velocidade com que nos é atirado, sem paragens.
Nas interpretações presentes temos Carlos Paulo e João Tempera.
Carlos Paulo, actor incontornável da Comuna, é tecnicamente perfeito. Prova disso é, por exemplo, a sua interpretação na peça Do Desassossego, também na Comuna, em que interpretava seis personagens diferentes, todas elas com bastante profundidade.
Em Agonia Irreversível tem o corpo, voz e dicção certos, não falha o ritmo em catadupa nem os silêncios, nem a respiração. Fica-se apenas com a sensação de que uma pequena imperfeição o tornaria brilhante. A sua interpretação é sempre muito racional, técnica, não há vestígios da falha humana.
Bruno Simão |
Ao longo da peça a sua interpretação é bastante histriónica e afectada, mesmo quando à sua personagem é atribuída a parte mais racional daquela relação.
Esta pode ser uma decisão de encenação, uma vez que a outra personagem era mais sofrida, mais contida, mesmo nos seus momentos de força.
No entanto, lembramos alguns momentos da personagem de João Tempera em Design for Living, que também eram apresentados nesse nível do exagero.
Fotografia de Bruno Simão |
Esta peça, do espanhol Juan Benet, assenta indiscutivelmente no texto, tudo o resto lhe é acessório e serve apenas para o sustentar. É um drama psicológico desenrolado em conversas filosóficas e silogismos em espiral que apenas permite ao público respirar quando os actores o fazem.
O texto é forte do início ao fim e tem a particularidade de poder proporcionar murros no estômago consecutivos a quem se der ao trabalho de pensar.
É a vida do Homem com todas as contradições inexplicáveis que apresenta, com todos os problemas que pensamos e sentimos, com a capacidade de regeneração que lhe é inerente.
É a vida pensada ponto por ponto, com tudo o que isso pode ter de bom e de mau.
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