The spectacular now

spoiler alert

Simon Stephens inspirou-se no tiroteio de 1999 na Columbine High School para escrever Punk Rock, que estrearia dez anos depois. Ao autor interessou pensar e escrever sobre o tipo de problemas com que se debatem os jovens e, mais concretamente, os jovens de classe mais alta, mostrando que estes também não escapam às questões existenciais adolescentes.

Pedro Carraca, o encenador do espectáculo, diz mesmo que o que o preocupa é que actualmente essas questões permanecem até cada vez mais tarde. "Não é incomum, hoje, ver gente de 30 anos com estes dilemas, isso é que me assusta, ver que há tanta gente sem saber o que fazer da vida porque vêem frustradas as hipóteses de fazer aquilo que realmente querem".


É novamente um olhar sobre o que se pode estar a passar entre os jovens, sobre problemas modernos, como tínhamos visto em A 20 de Novembro, que esteve também em cena na Politécnica, no final de 2013. "Aqui a diferença é que não se trata de um indivíduo marginal, mas sim de um grupo de pessoas aparentemente normais, estes problemas existem para além dos grupos considerados problemáticos", diz-nos Pedro Carraca.
É um texto que, por parte do autor e do encenador, não pretende transformar num monstro o assassino mas sim olhar para as causas, tentar perceber o que pode levar um jovem a um extremos destes, como tem acontecido. "Qual é o papel da sociedade nestas tragédias, qual é de facto a responsabilidade do sistema, de todos nós perante este jovem?" pergunta-se o encenador.


Em cena temos sete miúdos a testar-se, a conhecer, a partilhar, a tentar viver e sobreviver ao secundário. Para a maioria, o fim dos exames que se aproximam significa o início da liberdade, a partir daí têm o mundo inteiro para conquistar, podem ser o que quiserem, como se a adolescência fosse ficar presa naquelas paredes.
Naquela pequena sala de estudo vive-se o receio em relação ao sucesso e a certeza dele, a relação com a família e a sexualidade, a solidão, a auto-mutilação, a depressão, o bullying, o amor e o desespero de não poder mudar o mundo ou não conseguir pertencer-lhe.

Todo o espectáculo tem uma energia muito forte, acentuada pelos momentos de música punk-rock que passam por bandas como White Stripes, Sonic Youh ou Mudhoney. 
Os actores, todos muito jovens, com excepção do que aparece apenas no final, têm na sua maioria interpretações pungentes e sólidas, personagens fortes e coerentes que reforçam a força e crueza do texto.
O cenário é estranhamente contrastante com os figurinos e com o interior de colégio da alta que esperamos ver. Está mais de acordo com que se passa dentro daquelas cabeças, naquelas vidas e nas relações que ali se vão estabelecendo. É como se fizesse parte do mundo que aquelas personagens sentem e não do mundo em que vivem.


Punk Rock ganha ainda por se afastar de moralismos, mostra o que acontece, quer seja mais ou menos chocante aos que pensam estar longe desta realidade. Não exagera e não encobre. Não resolve. Afinal, porque é que ele fez aquilo? "Porque podia."

Uma das personagens deixa a mensagem aos mais distraídos: "Noventa por cento dos jovens neste país fazem um óptimo trabalho na simples tarefa de estar vivo".
A ideia não é a vitimização mas o olhar de facto para o que se passa, o que quase nunca se faz porque a maioria desses jovens "vai sobreviver. E ser feliz. (...) Viver vidas que são boas e felizes." A maioria.
Parece que só nos damos conta dos restantes quando um deles decide pegar numa arma e explodir toda a frustração que tem.



Fotografias cedidas por Artistas Unidos


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Meet The Author

Rita Branco Jardim é actriz de formação e escritora de inspiração. Começando pelos diários adolescentes e pelos embaraçosos concursos de escola, foi crescendo enquanto escrevia poesia, prosa poética e pequenas peças de teatro. Autora de blogs pessoais e culturais, criou o Sobre as Cenas, inicialmente apenas ligado à crítica de teatro mas que quer agora estar mais aberto a outro tipo de textos: os avulsos. Neste momento, escreve no Sobre as Cenas sobre teatro e o que mais lhe der na real gana. Bem-vindos ao Sobre as Cenas!