Em Frágil há duas personagens mas por razões orçamentais, dizem-nos, apenas há um actor e o público será a segunda personagem.
Este é um jogo potencialmente interessante e perigoso que deixa muita curiosidade quanto ao resultado durante uma temporada de opinião pública.
Potencialmente interessante porque o espectáculo vai variar um pouco consoante o público, a sua reacção e interacção com o actor em palco. Mas sobretudo é interessante a ideia do autor, David Greig, de nos pôr no papel do cidadão tão actual e tão next door que diz estar revoltado com o sistema mas não deixa de fazer parte dele e de tentar justificá-lo no seu dia-a-dia.
Potencialmente perigoso quase pelas mesmas razões. O espectáculo variará consoante o público e o público pode não gostar de ser intimado a participar, a ter voz activa, a interagir e mais, a ser acusado ou rotulado como esse tal cidadão. Claro que se trata de teatro, nenhuma ofensa de maior pode advir de um público ser convidado a dizer um texto. Contudo, há espectadores que vão ao teatro para se distrair, pensar, divertir mas sempre sossegados na plateia e não para serem incentivados a tomar uma acção ou posição qualquer, na plateia e na vida.
Há quem diga que é precisamente esta a função da arte e do teatro em concreto. Eu vou abster-me de discutir sozinha esta imensa questão, direi apenas que estou francamente curiosa com a reacção do público porque, acho, qualquer uma será válida.
Artistas Unidos |
O público é Carolina, cabe-lhe lidar com esta situação. Cabe-lhe explicar que apesar de não concordar não pode fazer outra coisa senão continuar. Cabe-lhe pedir-lhe o isqueiro, resignada, tentar salvar um, já que o mundo não dá.
A encenação é simples, o actor encara-nos, nós encaramo-lo duramente e a acção passa-se nisto sem mais distracções. Muito forte a cena porque a energia não dispersa, está sempre nesta relação directa.
A peça tem cerca de meia-hora apenas, é pena, ficamos com vontade de desenvolver tudo aquilo mas no fundo, com aquela intensidade, será que não fica já tudo dito?
Em entrevista Pedro Carraca diz que o mais interessante será o dispositivo da peça em si. “Gosto da forma que o David Greig arranja de pôr as pessoas no papel das que reclamam mas pouco ou nada fazem. Obriga a uma reflexão por parte de quem tem esta conduta. Por outro lado também há uma crítica ao processo revolucionário. O Jack sabe que aquilo pode correr mal, mas mesmo assim deseja a mudança. Assim é que não pode continuar. Pode tudo piorar, mas já está fodido, logo tem que mudar.
Esta peça é sobre pessoas que não têm nada a perder e sobre pessoas que tentam ajudar outras pessoas. Não é sobre maluquinhos. Eu acho que o desespero não é loucura. É perigoso pensar no Jack como um maluco porque isso retira-o do grupo de cidadãos comuns e aquela problemática deixa de ser da sociedade e passar a ser um problema apenas daquele coitadinho ou de um grupo de coitadinhos.”
E ele cede?
“Não sei. Acho que é engraçado porque te coloca a ti nessa posição. Tu é que decidides se queres ceder ou não.”
No final do espectáculo sente-se um: Porra, arrepiante! E eu não sei se o medo é por ele ir acender o isqueiro ou por desistir de o fazer.
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